Hoje, por alguma razão que não sei explicar, lembrei-me de um episódio que me fez suspirar de alívio por já não morar em Vila do Conde.
Durante o Festival de Curtas Metragens deste ano, ouvi uma rapariga que já conheço há uns anos gozar com a mulher de um rapaz que também lá trabalhou, porque ela não é bonita. Mais grave que isto: ela gozou com a mulher dele, em frente a ele.
Na altura só pensava no absurdo que isso era, que isso faz-se quando somos miudinhas, e nem sequer nessa altura tem desculpa, quanto mais aos vinte e tal anos.
Isto é do género de coisas que me faziam querer sair da minha cidade e que sempre me fizeram pensar que a cidade era pequena demais para mim.
Não me entendam mal: eu gosto muito de Vila do Conde, adoro voltar cá, adoro os meus amigos de cá, as particularidades da cidade, e posso ser muito tendenciosa quando digo que a cidade é lindíssima, mas também sou sincera. Por outro lado, não me tenho por uma cosmopolita nata, admito a minha costela provinciana com todo o orgulho.
Mas ver o que vi, ouvir o que ouvi, viver o que vivi durante tantos anos, fez-me perceber sem margem para dúvidas que as cidades pequenas serão sempre cidades pequenas.
Inventam-se histórias, boatos, fazem-se juízos de valor com base em princípios absolutamente fúteis. O que interessa é o aspecto: da cara, do corpo, das roupas, dos carros.
A juntar a isto, numa cidade desta dimensão, e deste desenvolvimento sócio-cultural, as pessoas "da cidade" acham-se no direito de gozar com as pessoas "da aldeia". Não suporto isto.
Não sei se Vila do Conde é somente herdeira de um legado novo-rico do Norte, durante anos zona rural, com um desenvolvimento exponencial e riquezas súbitas surgidas paralelamente - sinceramente, nem quero saber.
Numa cidade em que tudo se comenta, tudo se critica, tudo se inventa, não serei concerteza eu a deitar achas na fogueira.
Como uma vez me disse um amigo conterrâneo "Vila do Conde é uma aldeia com vícios de cidade".
Não quero ser nem acho que deva ser a filha ingrata, mas o meu amigo tinha toda a razão.